05/09/2012
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19h59
REINALDO JOSÉ LOPES
EDITOR DE "CIÊNCIA+SAÚDE"
Parece que a ciência finalmente está começando a abrir a caixa-preta do
genoma. Um novo olhar sobre o conjunto do DNA humano indica que ao menos
80% de seus 3 bilhões de "letras" químicas têm alguma função. E sim, isso é surpreendente --porque, desde que o genoma humano foi
soletrado pela primeira vez, há 12 anos, a impressão que ficou é que 95%
dele era "DNA-lixo".
Tal tralha evolutiva não era mais usada pelo organismo para a suposta
função primordial dos genes: servir de receita para a produção das
proteínas que constroem o organismo (veja infográfico abaixo).
Agora, porém, um megaconsórcio de cientistas, o Encode, liderado pelo britânico Ewan Birney, diz que o "lixo" é uma ilusão.
Embora não estejam diretamente ligadas à produção de proteínas, quase
todas as áreas do genoma teriam função reguladora ou serviriam de
"molde" para a produção de vários tipos de RNA, outra molécula crucial
para a vida. É possível pensar nesses elementos reguladores como uma série de botões
de liga e desliga, que atuam sobre o mesmo gene ou sobre genes
diferentes. Mas a coisa é ainda mais complicada. Isso porque eles não regulam apenas dois estados simples de "ligado" e
"desligado". Podem fazer o mesmo gene produzir várias proteínas
diferentes, por exemplo. Podem atuar um sobre o outro, potencializando
ou diminuindo sua ação.
"Essas diferenças regulatórias talvez sejam as principais responsáveis
por aspectos que tanto nos intrigam: existem sequências de DNA que nos
fazem 'humanos'? Quais as alterações genéticas que diferenciam cada um
de nós?", exemplifica Emmanuel Dias-Neto, biólogo molecular do Hospital
A.C. Camargo, em São Paulo. "Todos esses aspectos, incluindo a patogênese de doenças complexas, que
são a imensa maioria, são impactados por esses achados. E as doenças
complexas são ainda mais complexas do que imaginávamos", diz ele.
Tom Whipps/Nature |
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Os cientistas Ewan Birney, Tim Hubbard e Roderic Guigo com "dançarinas do DNA" em apresentação do estudo | | |
Para Dias-Neto, os pesquisadores de hoje têm uma vantagem crucial para
melhorar ainda mais essa análise: custo. Hoje, soletrar um genoma
inteiro custa "só" US$ 1.000. A revista britânica "Nature", onde o grosso dos dados está saindo hoje,
numa montanha de artigos científicos, fez questão de marcar o feito com
pompa. Após a conferência em Londres na qual os resultados foram
anunciados, houve até a apresentação de uma "dança do DNA".
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Editoria de arte/folhapress |
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